Da Boa Entrada a Monte Belo Da Boa Entrada para a Roça Monte Belo já não consigo lembrar ao certo que distancia havia, mas sem receio de errar muito, seriam cerca, para mais, de uma centena de quilómetros. Já falei dos horríveis acontecimentos de barbárie acontecidos no Norte de Angola em 1961 e que fizeram desmembrar as famílias e tentando nós por mais a salvo mulheres e crianças, optámos todos por deslocá-las para a Boa Entrada que como sede dessa grande Companhia Angolana de Agricultura a CADA, oferecia melhores condições de segurança e para tal nos proporcionou transporte possível e digo possível porque foi feito em camionetas de carga onde se transportava o café Acompanhados de algum choro e muita incerteza lá vimos partir os nossos queridos e recordo que minha filha teria 6 meses de idade. Passadas já algumas semanas as saudades faziam-nos toldar a cabeça por parcas noticias pessoais e politicas e sem sabermos que fazer assim íamos permanecendo na incerteza sobre que fazer e que futuro… Então vivíamos adaptando-nos ao meio já só masculino e na incerteza de com e em quem poderíamos contar e confiar tentávamos inventar “coisas” para superar tudo o que nos faltava. O meu maior entretém era o de fazer e tomar a companhia na fábrica do Fernando Reis pois era a pessoa mais evoluída, educada e estudada ali e com quem apetecia conversar. Rapaz simples de cor morena bronzeada e sempre com um riso pronto a mostrar, era simples e muitas vezes a conversa do Fernando lá fugia para as meninas pois ele era um conquistador que arrasava alguns corações incluindo o da filha do Administrador o Mata-Neve que era um Beirão pouco culto e de dujas conversas não sobrava senão café. Ele gostava do Fernando. Só que a filha tinha amores por ele mas o contrário não existia embora a moça fôsse jeitosona. O Fernando além de excelente amigo e eu era um dos cimeiros na sua lista e adorava o meu rebento punha tudo o que possuía ao dispor dos que mais gostava. Inclusive tinha uma carrinha aberta Bedford onde eu ia relembrando o meu ainda ténue pilotar e um dia que saí cafezais adentro ao fazer uma manobra levo uns cafeeiros de raspão com a traseira. Voltei e enquanto eu contava e mostrava o quanto fiquei chateado o Fernando ria a bom rir dizendo que isso eram louvores para a “menina” (entenda-se, a carrinha) que por ele também estava a isso habituada. E ria, ria… Era um prazer vê-lo sem parar a verificar a secagem do café, o descasque, a separação do bago, a escolha muita dela manual, num ambiente onde reinava o feminino e ouvir a alegria dos cantares que se sobrepunha ao ruído dos motores. O cheiro do café evitava-nos a ingestão dele em bica como agora se usa. Todo o empregado tinha direito entre outros bens da terra a uns quilos de café por casa e por mês. Não íamos muitas vezes buscá-lo pois esse hábito de bica não o havia e parece-se com quem faz bolos ou cozinha e apenas prova do que faz e fica satisfeito. Que prazer era ver o café antes de entrar na fábrica a secar na primeira preparação ao sol em terreiro bem batido para que a terra não se misturasse e ver a todas as horas os trabalhadores com rodos de madeira fazendo risquinhos para lá e para cá, qual tratamento de hoje á relva de um estádio de futebol e debaixo de um sol escaldante que não poupava a queda sobre os bagos de muitos pingos de suor. Será que este lhes dava algum gosto especial? O Fernando um dia levou-nos á Roça em que seu Pai era Feitor o sr. Costa Reis, com convite para almoçar. O Pai era uma pessoa de trato simples que vivia com a Mãe do Fernando, uma Senhora Angolana que lembro de feições finas e comunicável como o marido. Viviam numa casa tipo colonial á semelhança de quase as estruturas habitacionais das outras Roças e parecia haver Paz naquela casa e quando chegámos á sala de refeições que sem querer mentir era no piso superior espanto-me quando vejo uma comprida mesa e muitas cadeiras a preencher espaços. É que o Sr e a Srª Costa raro era o fim de semana que não tinham a mesa preenchida pelos filhos e família, os amigos dos filhos, os amigos dos amigos e quem mais fosse ou não convidado a ir ou aparecesse. Ninguém, disse-me, fica sem lugar nesta mesa e nesta casa. Pensei para comigo se um dia eu seria capaz de fazer igual!!! Sempre perguntei pelo paradeiro do Fernando e um dia alguém me disse mas sem grande certeza que ele teria falecido em tempo de guerra. Quando voltei a Angola perguntei e ninguém soube informar-me pois eu creio que iria á Gabela ou Porto Amboím onde me disseram que ele teria estado a trabalhar só para lhe dar aquele abraço. E assim vivo esperando um dia em que nos encontremos. Deus o queira… Janº 2006 De- Augusto Rebola "Crónicas da CADA" Esta foi a 8 ª Edição. NGA SAKIRILA KINENE!! MBOIM !! :) AVISO-Estes escritos estão registados e protegidos pelo IGAC |
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